quinta-feira, 26 de agosto de 2010

“INVENTANDO A REGIÃO: OS INTELECTUAIS DO INSTITUTO CULTURAL DO CARIRI NA DÉCADA DE 50” – CONTRACULTURA, TRADIÇÃO E ORALIDADE POR ROBERTO MARQUES* UM RESUMO PARA O DEBATE DO CENTENÁRIO DE JUAZEIRO DO NORTE.

O Autor contextualiza o discurso dos intelectuais do ICC – Instituto Cultural do Cariri a partir da década de 50, descortinando o discurso simbólico da produção historiográfica encetada por seus próceres: J. de Figueiredo Filho, José Newton Alves de Souza, Joaryvar Macedo, F. S. Nascimento, citando ainda Irineu Pinheiro, Padre Antonio Gomes de Araújo, Martins Filho, Napoleão Tavares.

Com referencial teórico em Durkheim e Habwachs, Hobsbawn e Albuquerque Jr., procura descortinar a construção teórica que levaram a cabo no ICC: “vestindo-se com a armadura de uma coragem invulgar, [adentrarão] em velhos arquivos empoeirados [...] [a revelar] as verdadeiras origens do Cariri, seu descobrimento, conquista e povoamento” (MACEDO, 1985:60)”.

Além de aqueles intelectuais trabalharem com levantamentos biográficos, inventários, dados cartorários e arquivos da Igreja Católica é enfático em enumerar o trabalho de MACEDO (1985): “Dentre os 364 portugueses, 231 norte-grandenses, 456 paraibanos, 816 pernambucanos, 171 alagoanos e 48 maranhenses, apenas um ou outro tem seus herdeiros nomeados ou suas mais prestimosas obras descritas, ao contrário das sintéticas informações de nome completo e lugarejos descritos em geral no longo catálogo”. “Torna-se claro, pois, que não são brumas do passado que se tenta aqui dissipar, mas busca-se a nobreza da ascendência”.

Através de uma produção com viés “telúrico” e “nativista”, na “estirpe” e “nobreza ascendente” dos primeiros povoadores buscam “as autenticas raízes sociais da civilização no Cariri cearense e fundadores de sua aristocracia rural (MACEDO, 1985:54)”.

A tese geral é da reconstrução e construção de uma identidade regional a partir de um núcleo intelectual da elite cratense disseminada para restabelecer uma hegemonia política, cultural e intelectual com base no Crato, diferenciada do Ceará e do Nordeste e com ênfase original, tencionando as disputas históricas ocorridas entre Crato e a emancipação política de Juazeiro do Norte desde 1911, com a crescente mudança geopolítica e econômica de influência no Cariri.

O Cariri passa então a ser cultuado como objeto do desenvolvimento nacional a partir de uma tradição cratense de inserção em suas lutas políticas históricas de suposto protagonismo na unidade do Brasil como em 1817 e 1824. Assim, Roberto Marques citando Neves (1994) realça “utiliza a idéia de memória regional hegemônica a fim de reforçar a idéia da memória coletiva como objeto de constantes disputas”.

Ou como em J. de Figueiredo Filho (Tradicional e Progressista cidade do Crato, 1962), que enfatiza o Folclore, levantando as contradições com a “Cidade da Cultura” e a discriminação que sofreu historicamente no Crato de antão as bandas cabaçais, tidas como arcaicas, o maneiro-pau, luta de cabras e cangaceiros, a lapinha como relativização serena com o samba do terreiro “com suas brigas, namoros acochados e a cachaça a correr pelas goelas de cabras arruaceiros (1962:41-2)”.

“Meu pai, José Alves de Figueiredo Filho, prefeito naquela época, foi dos que, mais denodadamente, travaram luta contra o conjunto musical, tido como arcaico. Combatia-o em nome das coisas novas. Proibiu a exibição das cabaçais em dias comuns, e até nas feiras, a desfilarem pelas ruas (1962:12-3)”.

Ao mesmo tempo em que aqueles intelectuais faziam uma releitura social justificada, procuravam reinserir na memória cratense os signos da tradição regional para o contexto progressista unilateral e hegemônico, afastando o predomínio de Juazeiro do Norte no contexto, unindo tradição e religião.

“O Cariri é um pródigo exemplo para se refletir sobre a tradição como idéia fundante dos recortes espaciais na Região Nordeste”.

Os recortes no contexto da produção do Instituto Cultural do Cariri – ICC, na década de 50, segundo o autor avançam além de uma reinvenção da tradição, do folclore e buscam então uma delimitação geográfica com base na característica abundante de recursos naturais em torno da Chapada do Araripe e na Região do Cariri para recolocar a cidade de Crato novamente no centro do desenvolvimento, “apresentando o Crato como berço das famílias tradicionais da região, diante das hordas de romeiros da “Meca do Fanatismo”.

Por fim, o autor exemplifica citando Irineu Pinheiro (1953), que rememora a representação da Câmara de Vereadores do Crato em 10 de Julho de 1928, advogando a criação da província do Cariri Novo, cuja capital seria no Crato: “... aos poucos o ICC via forjando à sua imagem o que pretende ser a identidade caririense. Distinguindo-se da “Meca do Fanatismo” e constituindo a memória hegemônica sobre a região”.

E arremata: “Depois de instituído esse projeto, que sobrevive parcamente ainda hoje, depois de inventada a “Cidade da Cultura”, jamais deixará de haver novos artistas e intelectuais a inventar o Cariri. A geração de 70 será, portanto, herdeira, por vezes literalmente, e prisioneira desse projeto”.

Importante a leitura e releitura do texto para todos os intelectuais e estudiosos sobre nossas referências e diferenças, encontros e desencontros com a História do Brasil, ainda mais nesse momento em que Juazeiro do Norte está às vésperas do centenário e quando fora criada a Região Metropolitana do Cariri.



• MARQUES, ROBERTO

Contracultura, tradição e oralidade: (re) inventando o sertão nordestino na década de 70/Roberto Marques – São Paulo. Ed. Annablume, 2004. 168p.; 11,5 x 20 cm; ISBN: 85-7419-424-7.

OUTROS NORDESTINADOS NO CORAÇÃO DO BRASIL

"Eu quis amar mas tive medo

E quis salvar meu coração

Mas o amor sabe um segredo

O medo pode matar o seu coração

Água de beber

Água de beber, camará

Água de beber

Água de beber, camará"

(Vinicius de Moraes / Antonio Carlos Jobim)

Se de uma forma ou de outra somos brasileiros, enquanto povo de uma região demarcada administrativamente, nós somos o produto de nossa cultura ou de nosso espaço geográfico? Isso tem tanta ou mais importância que a delicadeza das palavras assentadas nas páginas da historiografia contemporânea diante da realidade persistente.

“A seca, o cangaço, o messianismo, as lutas de parentela pelo controle dos Estados, são os temas que fundarão a própria idéia de Nordeste, uma área de poder que começa a ser demarcada com fronteiras que servirão de trincheiras para a defesa dos privilégios ameaçados” (MUNIZ, 1999).

Ou, “O sertanejo, é antes de tudo, um forte”, como definiu Euclides da Cunha em OS SERTÕES : “O sertão, com seus ventos bíblicos, calmarias pesadas e noites frias, impressiona. Cortado por veredas e árvores retorcidas em desespero, todo ele são monótonos caminhos de caatingas e areais ressequidos. As "pueiras", lagoas mortas, de aspectos lúgubres, são o único oásis do sertanejo. A serra de Monte Santo, com seus tons azulados, é uma cortina de muralha monumental. As conformações rochosas, no ermo vazio do Bendegó, dão a ilusão de ruínas antigas. Os grandes desmoronamentos rochosos do sertão lembram "mares de pedras". Os rios salgados, quando secam, parecem um fundo de mar extinto, uma impressão acentuada pelos fenômenos ópticos do calor. Isso reforça a mítica sertaneja de que "um dia o sertão vai virar mar e o mar vai virar sertão".

O Brasil refunda-se com a globalização da economia. Almeja ficar entre os cinco maiores países de economia capitalista do mundo até a próxima década (XXI), o nordeste do Brasil arrasta-se para o desenvolvimento a pau-a-pique: Água e Sol. Energia e Transportes. Mão-de-obra e Tecnologia. Bem estar e Felicidade?

A partir de 1999 o litoral do Nordeste do Brasil passou a conviver com o fenômeno histórico da falta de abastecimento de água para as necessidades humanas comum no interior do sertão. Em 2006, o estudo “Atlas Nordestino” da Agência Nacional de Águas ., especificou que até 2025, 70% dos municípios com até cinco mil habitantes enfrentarão problemas de abastecimento de água. “O Semi-Árido, que ocupa uma área de 977 mil km², é caracterizado por reservas insuficientes de água em seus mananciais, temperaturas elevadas durante todo o ano, baixas amplitudes térmicas e forte insolação. Os totais pluviométricos, irregulares e inferiores a 900 mm, são normalmente superados por elevados índices de evapotranspiração, resultando em taxas negativas no balanço hídrico”.

O Governo do Presidente Lula, legitimou o que já havia sido escrito na Constituição de 1988 em seu artigo vinte e um que criou um sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos, definiu os critérios de outorga e direitos de uso da água, através do PROÁGUA/Nacional, nascido da experiência exitosa do PROÁGUA/Semi-Árido, com os atributos, compromissos e garantias do gerenciamento sustentável incorporados pela Lei 9.433/97.

A par disso, a transposição de águas do Rio São Francisco já é uma realidade, além disso, o rio abriga as hidroelétricas de Paulo Afonso I, II, III e IV, Itaparica e Moxotó, Sobradinho e Três Marias., integra áreas territoriais do Goiás, Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe. Da Serra da Canastra até desaguar no Atlântico são aproximadamente 2.660 Km. A transposição beneficia a Região Hidrográfica Atlântico Nordeste Oriental que abrange os estados do Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas, toda ela no semi-árido.

Com as obras da Ferrovia Transnordetina e a ampliação e conclusão dos portos do SUAPE no Pernambuco e PECÉM no Ceará, o semi-árido nordestino prepara-se para dar um salto de qualidade e capacidade na produção e exportação de mercadorias, bens e serviços.

A extensão de 1.728 kilômetros de ferrovia com bitola de exportação une Missão Velha-CE, Salgueiro-PE, Petrolina-PE e Juazeiro-BA passando por Eliseu Martins no Piauí, assim interligada às outras vias ferroviárias já existentes de bitola métrica, com as hidrovias e vias rodoviárias, potencializando a capacidade de desenvolvimento da produção e exportação.

O pólo gesseiro, a gipsita do Araripe, o nosso doce mel, flores, o algodão, ouro branco nordestino para o incremento da indústria têxtil, a cana-de-açúcar para a produção do álcool, do açúcar e da rapadura, o biodiesel, os calçados, o artesanato e a água mineral do Cariri serão cargas potenciais para o incremento das exportações dos sistemas locais de produção.

A agroindústria em Petrolina e Juazeiro, o minério de ferro, a siderurgia e refino de petróleo em fase de instalação em Pernambuco e no Ceará, a carne e o farelo de soja, tudo dentro de uma logística interligada através da Ferrovia Transnordetina e a proximidade dos portos do Suape e Pecém com a Europa são alvissareiros relampejos.

Assim, ainda não é tarde prá lembrar que uma “Produção Mais Limpa” requer : controle do ciclo da água no processo produtivo, uma vez que o consumo da água pela indústria representa 19% em todo o mundo, reciclagem das águas utilizadas, pois as perdas representam 20% do total, controle total com análise do ciclo de vida dos produtos e indicadores de gerenciamento ambiental; hão de garantir um futuro, sem medo, que outros nordestinados apaixonados pelos segredos do progresso morram de sede no coração do Brasil.


i) A invenção do Nordeste e outras artes”, Durval MUNIZ de, Albuquerque Junior, 1999. 4ª Ed. Recife-PE http://www.lojacortezeditora.com.br/lancamentos/cortez.html)



ii) CUNHA, Euclides, 1902. Sertões, OS. Domínio Popular.


iii) Web site: www.ana.gov.br


iv) http://www.ecopress.org.br/eco+watch/gerenciamento+dos+recursos+hidricos+na+industria

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

POLÍTICA E FLORES ENFRENTAM-SE, SEMPRE!

O elogio administrativo não é política, assim como a crítica administrativa não é política.
Política é afetação da realidade.

A realidade por si só corresponde ao dilema humano, ("...mais que demasiadamente humano"), de enfrentamento solitário dos conceitos intrínsecos à psiquê, do amor sexual, da reprodução e produção para si de uma vida para o futuro, de outros tantos vetores íntimos.

Política é o enfrentamento coletivo das partes no todo. É por isso que uma política de elaboração teórica, sem um quê de afetação da realidade, não convence, não prepara para o enfrentamento os indivíduos da parte, e assim, todo aquele partido.

Como por exemplo, uma política ambiental de preservação do semi-árido no nordeste do Brasil.

Um movimento social ou uma lei aprovada para esse fim que não arme o sertanejo interessado na preservação do semi-árido para o enfrentamento das corporações empresariais, como no caso da exploração do clima e solo para o plantio de flores, que, segundo o Banco do Nordeste do Brasil, garante uma produção de 200 rosas por m2/ano, duas vezes superior à produtividade da Colômbia, maior produtor latino americano de flores, simplesmente vai naufragar e desencadear outro desastre histórico como no caso da cana-de-açúcar no setecentos nordestino. Ora, já em 1998, veio o título: "Nordeste é o jardim da Europa".

Com estufa e irrigação: Crisântemos, tango, aster, gipsofila, lírio, gérbera, girasol e margaridas cultivadas a quatro graus da linha do Equador, os bulbos do Ceará para a Holanda: Viva o Dia das Mães!

Violetas, lírios, helicônia, o bastão-do-imperador, CRAVOS!

Então, mesmo que seja com flores, há uma política de exportação e de degradação do ambiente semi-árido como sempre se nos apresentou, daí a necessidade de afetação dessa realidade, de enfretamento dos diversos vetores envolvido, como geração de empregos, divisas internacionais, etecetera.

Política e flores enfrentam-se, sempre!

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Bertolt Brecht

Viesse um vento
Eu poderia alçar vela.
Faltasse vela
Faria uma de pano e pau.
...

Bertolt Brecht